Vamos combinar assim: os posts antigos eu não vou alterar para não afetar a originalidade dos mesmos, mas a partir de janeiro eu tento "dançar conforme a música".
NOS BECOS DA WEB...
terça-feira, 30 de dezembro de 2008
domingo, 21 de dezembro de 2008
autismo selvagem
o tempo em que eu estive na floresta
percorrendo caminhos subterrâneos
buscando atalhos marginais
manteve-me longe de tudo o que é socializado.
Agora sou uma só
mergulhada no meu próprio mundo
autofagicamente.
percorrendo caminhos subterrâneos
buscando atalhos marginais
manteve-me longe de tudo o que é socializado.
Agora sou uma só
mergulhada no meu próprio mundo
autofagicamente.
quinta-feira, 18 de dezembro de 2008
quarta-feira, 17 de dezembro de 2008
Veneno engavetado
Só agora percebo o quanto de autodestruição existe no surrealismo. Mas ainda não estou bem certa se a autodestruição é realmente inerente ao surrealismo ou se coincidiu de eu ser ao mesmo tempo surrealista e autodestrutiva. Não me lembro quantos anos tinha quando me deparei com obras de Dali, numa exposição (o que me parece natural: diante de uma verdadeira obra de arte, não temos idade nenhuma, ou todas as idades ao mesmo tempo: uma sensação de eternidade nos perpassa).
Na ocasião, fiquei impressionada e admirei o que via. Creio que se me deparasse com tais obras novamente, novamente me impressionaria e provavelmente também as admiraria, mas com uma consciência diferente, talvez um certo receio ou um desdém (não um desdém proveniente da inveja, do despeito de não ter sido eu a criadora de magníficas obras, mas o desdém de quem se acha superior por não ser mais tão mórbida como provavelmente foi mórbido quem criou tais obras).
Nem sei como, com toda a minha ignorância a respeito do assunto, atrevo-me a falar sobre tais coisas, mas alguém me disse uma vez como se o próprio Dali considerasse o surrealismo uma doença, e no final da vida se sentisse curado. Nesse caso, suas obras são dignas por serem o testemunho e a terapia de uma doença que afinal foi curada, talvez pela própria arte que foi, nesse caso, uma supuração.
Na ocasião, fiquei impressionada e admirei o que via. Creio que se me deparasse com tais obras novamente, novamente me impressionaria e provavelmente também as admiraria, mas com uma consciência diferente, talvez um certo receio ou um desdém (não um desdém proveniente da inveja, do despeito de não ter sido eu a criadora de magníficas obras, mas o desdém de quem se acha superior por não ser mais tão mórbida como provavelmente foi mórbido quem criou tais obras).
Nem sei como, com toda a minha ignorância a respeito do assunto, atrevo-me a falar sobre tais coisas, mas alguém me disse uma vez como se o próprio Dali considerasse o surrealismo uma doença, e no final da vida se sentisse curado. Nesse caso, suas obras são dignas por serem o testemunho e a terapia de uma doença que afinal foi curada, talvez pela própria arte que foi, nesse caso, uma supuração.
segunda-feira, 1 de dezembro de 2008
mil paranóias
pirulito profilático
profecia profícua
proeza profana
profundos parênteses
paralelepípedos petrolíferos
parapeito portátil
pórtico prateado
pranteando pus
pútrido pão
pérfido pó
primícias poligonais:
Portanto, polinizo
pólipos paradoxais.
profecia profícua
proeza profana
profundos parênteses
paralelepípedos petrolíferos
parapeito portátil
pórtico prateado
pranteando pus
pútrido pão
pérfido pó
primícias poligonais:
Portanto, polinizo
pólipos paradoxais.
segunda-feira, 24 de novembro de 2008
clandestina
Ela penetrou em meu recinto
para roubar informações sigilosas.
Construiu uma teia de palavras ao meu redor.
Como uma abelha tece a sua colméia.
Como uma larva tece seu casulo.
Mas não tem mel, não tem borboleta.
Apenas tudo o que é infame!
E como livrar-me dessa excrescência?
Camada podre
a sobejar da minha pele...
Calúnias urdidas por um crocodilo insone!
para roubar informações sigilosas.
Construiu uma teia de palavras ao meu redor.
Como uma abelha tece a sua colméia.
Como uma larva tece seu casulo.
Mas não tem mel, não tem borboleta.
Apenas tudo o que é infame!
E como livrar-me dessa excrescência?
Camada podre
a sobejar da minha pele...
Calúnias urdidas por um crocodilo insone!
domingo, 23 de novembro de 2008
Ninguém liga pra ela
orelha de elefante
pétala de rosa
camada de torta
folha de muçarela
página recheada de letras...
pétala de rosa
camada de torta
folha de muçarela
página recheada de letras...
sábado, 22 de novembro de 2008
O livro como fetiche
Mais ou menos no começo desse ano, li Alucinações musicais, do médico Oliver Sacks. E tenho mania de assinar todo livro que compro. Assim, este também foi assinado. Mas durante a leitura do mesmo, observei que ele seria interessante e ao mesmo tempo útil à minha prima, que tem mais conhecimento de música do que eu. Assim, embora o livro já estivesse assinado, fiz, em outra página, uma dedicatória à minha prima, mas ainda não entreguei o livro a ela, já que esse ano só a vi uma vez. Devo entregar no Natal. Outro dia estava pensando que seria interessante reler esse livro. Mas agora não é a hora de relê-lo (tenho outros livros para dar cabo), o Natal está aí, teria que comprar outro. E aí surgiu o desejo de comprar outro Alucinações musicais.
Terminando uma pós-graduação em Estudos Literários, comecei a escrever uma monografia sobre o texto "O ovo e a galinha", de Clarice Lispector. Tarefa um tanto ousada, devido à complexidade do texto. Meu orientador me desencorajou a fazê-lo, assim, fiz uma monografia sobre outro texto, da mesma autora, e meu trabalho final ficou aquém das minhas possibilidades (eu me julgo capaz de fazer algo bem melhor!). Mas outro dia, lembrando-me do texto que comecei a escrever sobre "O ovo e a galinha", deu-me vontade de dar continuidade ao projeto, e para fazê-lo como havia planejado desde o início, eu teria que ler O gene egoísta, de Richard Dawkins, livro que, até hoje, eu achava que ainda estava esgotado. Pensando ser impossível encontrá-lo para comprar, a não ser que achasse num sebo por acaso, outro dia pedi ao meu irmão que mora em outro estado (e tem muitos estados separando os nossos) que o trouxesse para mim no Natal, para me emprestar.
Pois bem: hoje chego a um supermercado cujo acesso não é tão fácil, e lá logo na entrada há uma banca cheia de livros, e entre os livros há Alucinações musicais e O gene egoísta, ambos por quase a metade de seu preço normal. Uma tentação. Meu objetivo no supermercado não era esse; parei de trabalhar, ou seja, a grana está acabando, então não os comprei. Agora, em casa, enquanto lia outro livro, lembrei-me dos que não comprei hoje e analisando se devia tê-los comprado ou não, não senti nenhum arrependimento, pelo contrário, aprovei minha atitude econômica: afinal O gene egoísta posso ler de graça, Alucinações não iria reler tão cedo e seria mais um item hipertrofiando a infinita lista de livros a serem lidos, mas, o que mais me deu prazer foi notar que consegui conter meu impulso consumista. Livros são sempre bons, mas comprá-los por comprá-los, sendo que podemos pegar emprestado com alguém ou numa biblioteca (O gene egoísta, pelo menos antes de ser reeditado, era difícil de ser encontrado até em bibliotecas - artigo raro) ou comprar um livro que não iremos ler de imediato, apenas porque está exposto na prateleira do supermercado e nos sentimos tentados a adquiri-lo como se deseja um outro produto qualquer, nessa sociedade consumista em que vivemos, nessa ânsia que sentimos de POSSUIR o que está do outro lado da vitrine, barreira de vidro que nos impede de tocar o fetiche. Enfim, sou uma heroína: NÃO comprei dois livros hoje.
Terminando uma pós-graduação em Estudos Literários, comecei a escrever uma monografia sobre o texto "O ovo e a galinha", de Clarice Lispector. Tarefa um tanto ousada, devido à complexidade do texto. Meu orientador me desencorajou a fazê-lo, assim, fiz uma monografia sobre outro texto, da mesma autora, e meu trabalho final ficou aquém das minhas possibilidades (eu me julgo capaz de fazer algo bem melhor!). Mas outro dia, lembrando-me do texto que comecei a escrever sobre "O ovo e a galinha", deu-me vontade de dar continuidade ao projeto, e para fazê-lo como havia planejado desde o início, eu teria que ler O gene egoísta, de Richard Dawkins, livro que, até hoje, eu achava que ainda estava esgotado. Pensando ser impossível encontrá-lo para comprar, a não ser que achasse num sebo por acaso, outro dia pedi ao meu irmão que mora em outro estado (e tem muitos estados separando os nossos) que o trouxesse para mim no Natal, para me emprestar.
Pois bem: hoje chego a um supermercado cujo acesso não é tão fácil, e lá logo na entrada há uma banca cheia de livros, e entre os livros há Alucinações musicais e O gene egoísta, ambos por quase a metade de seu preço normal. Uma tentação. Meu objetivo no supermercado não era esse; parei de trabalhar, ou seja, a grana está acabando, então não os comprei. Agora, em casa, enquanto lia outro livro, lembrei-me dos que não comprei hoje e analisando se devia tê-los comprado ou não, não senti nenhum arrependimento, pelo contrário, aprovei minha atitude econômica: afinal O gene egoísta posso ler de graça, Alucinações não iria reler tão cedo e seria mais um item hipertrofiando a infinita lista de livros a serem lidos, mas, o que mais me deu prazer foi notar que consegui conter meu impulso consumista. Livros são sempre bons, mas comprá-los por comprá-los, sendo que podemos pegar emprestado com alguém ou numa biblioteca (O gene egoísta, pelo menos antes de ser reeditado, era difícil de ser encontrado até em bibliotecas - artigo raro) ou comprar um livro que não iremos ler de imediato, apenas porque está exposto na prateleira do supermercado e nos sentimos tentados a adquiri-lo como se deseja um outro produto qualquer, nessa sociedade consumista em que vivemos, nessa ânsia que sentimos de POSSUIR o que está do outro lado da vitrine, barreira de vidro que nos impede de tocar o fetiche. Enfim, sou uma heroína: NÃO comprei dois livros hoje.
quarta-feira, 19 de novembro de 2008
Yocablan e os pêssegos
Era uma vez um rapaz chamado Yocablan. Yocablan era apaixonado por pêssegos. Mas sua mãe mantinha um pêssego dentro de uma redoma de vidro e o proibia de comê-lo. Yocablan comia os pêssegos comuns mas nunca o pêssego que ficava sob o vidro, pêssego que era mágico e não apodrecia nunca, e que tinha um sabor muito superior aos demais pêssegos. Um dia, quando Yocablan já tinha sessenta anos, sua mãe morreu. Mas mesmo após a morte de sua mãe, Yocablan não ousou tocar o pêssego encantado. Yocablan polia o vidro da redoma, admirava o pêssego, mas nunca teve o prazer de comê-lo, limitando-se aos reles pêssegos encontrados nas feiras e supermercados, incomparáveis ao extraordinário pêssego da redoma. Até que Yocablan morreu e o pêssego continuou sob o vidro. Mas a tradição fora passada a seu filho Eustáquio, que nem ligava tanto assim para pêssegos, mas respeitava a tradição da família de não profanar o pêssego sagrado. Eustáquio, porém, esqueceu de advertir seu filho Humberto, que quando tinha dezesseis anos, vasculhando o sótão de sua casa achou uma redoma empoeirada e foi verificar o que tinha embaixo dela, achou um pêssego aveludado e fluorescente, comeu-o e achou uma delícia, e verificou estupefato que do lugar de onde ele retirara o pêssego, nascera outro. Humberto apaixonou-se por pêssegos, que nunca tinha provado até então, e assim, sempre que tinha vontade de comê-los, ia até o sotão e os saboreava veementemente, pois na bandeja de madeira sob a redoma sempre nasciam novos pêssegos, assim que o "último" era comido.
Alheio ao mundo, ele estava suspenso na Bolha de Eros, flutuando muito acima da realidade cotidiana. Nada detia seu olhar antes escrutador, tudo estava horizontalizado e tudo era desinteressante: só UMA coisa lhe interessava, só UMA única coisa lhe era urgente. Ele virou um algodão embebido da água do amor, e, uma vez embebido de tal água, nada mais ele podia absorver: tudo o mais seria óleo, sempre incompatível com a água.
segunda-feira, 17 de novembro de 2008
Interstício
e do vício
ela lidava com o resquício
numa atitude capadócia
toda vez que ócio
oscilava inquieto.
Prenúncio
de um cio açucarado,
ósculo macio
ciciado no vento
(que é um túnel sem teto).
ela lidava com o resquício
numa atitude capadócia
toda vez que ócio
oscilava inquieto.
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de um cio açucarado,
ósculo macio
ciciado no vento
(que é um túnel sem teto).
sexta-feira, 14 de novembro de 2008
Axolotles
Links para um conto de Cortázar:
em português_ http://paginas.terra.com.br/arte/dubitoergosum/recorte19.htm
em espanhol_ http://www.literatura.us/cortazar/axolotl.html
Eu sou a sombra do nada
Tudo o que havia de mais sincero em meus textos escritos foi bloqueado na minha ânsia de negar a autobiografia.
Mas um soneto que resume a minha vida sempre, mesmo tendo sido escrito há alguns anos e já postado em blog anterior, é esse:
Não tenho nada:
nenhuma qualidade e nenhum defeito.
Não sou amiga de ninguém:
nem do mendigo e nem do prefeito.
Não peço esmola a nenhum cidadão:
Pago o meu próprio preço
de viver num mundo cão,
como mereço.
Vivendo esta vida rude
em que quase nada pude
pergunto-me então:
Terá sorte o embrião?
Ou será que a mãe, que o embala,
também o ilude?
Não adianta fugir da autobiografia. É isso: a primeira estrofe foi escrita há quase 8 anos atrás, mas continuo não tendo nada nem ninguém (o restante do poema foi escrito mais recentemente).
Mas um soneto que resume a minha vida sempre, mesmo tendo sido escrito há alguns anos e já postado em blog anterior, é esse:
Não tenho nada:
nenhuma qualidade e nenhum defeito.
Não sou amiga de ninguém:
nem do mendigo e nem do prefeito.
Não peço esmola a nenhum cidadão:
Pago o meu próprio preço
de viver num mundo cão,
como mereço.
Vivendo esta vida rude
em que quase nada pude
pergunto-me então:
Terá sorte o embrião?
Ou será que a mãe, que o embala,
também o ilude?
Não adianta fugir da autobiografia. É isso: a primeira estrofe foi escrita há quase 8 anos atrás, mas continuo não tendo nada nem ninguém (o restante do poema foi escrito mais recentemente).
quinta-feira, 13 de novembro de 2008
domingo, 9 de novembro de 2008
sábado, 1 de novembro de 2008
terça-feira, 14 de outubro de 2008
segunda-feira, 13 de outubro de 2008
Estria
E as lágrimas corriam com tanta freqüência que formou-se um sulco em seu rosto. Leito de um rio perene. E no dilema energia X ecologia, cria-se um meio "limpo" de produzir energia: a depressão hidrelétrica...
terça-feira, 7 de outubro de 2008
domingo, 5 de outubro de 2008
Lacunas
Meus anti-posts, ou seja, tudo o que eu não posto, facilita a vida das pessoas ávidas por leitura. Porque a gente nunca dá conta de ler tudo quanto deseja, é sempre um novo livro a ser adicionado na lista dos próximos a serem lidos, e mais um jornalzinho aqui, uma bula de remédio ali, e o tempo passa e ainda não li nenhum livro do Borges, porque estou agarrada nO passado, do argentino Alan Pauls, que já lançou História do pranto (mais um na lista), e estou agarrada porque tenho que trabalhar, afinal não sou nenhuma princesa para ficar a semana toda só lendo e tocando piano e comprando vestidos para ir à próxima festa. Aí a leitura não rende.
É claro que cada leitor delimita um alvo específico de textos a serem lidos, e eu tenho muito poucos leitores, mas facilito pelo menos a vida de meu amigo Zé Maurício, que enfrenta o mesmo problema que eu da lista infinita de textos a serem "devassados".
Outra coisa que facilita a minha vida e a de meu amigo Zé Maurício e imagino de outras pessoas também, é que os escritores são mortais. Mas sempre tem aquele texto inédito que é achado no fundo de algum baú ou gaveta, assim, a obra de cada escritor não é tão limitada quanto a morte pareça limitar. Assim, minha atual "mudez" (nesse novo blog que quase nunca posto) é a minha contribuição para esses insaciáveis leitores. Aliás, já que "eles" são insaciáveis, não há contribuição, é indiferente que eu escreva ou deixe de escrever.
Que não se pense que isso é uma tentativa de explicação para minhas palavras escassas, é mero "insight" que aproveitei para transformar em post preenchendo assim a lacuna do meu calendário blogal.
É claro que cada leitor delimita um alvo específico de textos a serem lidos, e eu tenho muito poucos leitores, mas facilito pelo menos a vida de meu amigo Zé Maurício, que enfrenta o mesmo problema que eu da lista infinita de textos a serem "devassados".
Outra coisa que facilita a minha vida e a de meu amigo Zé Maurício e imagino de outras pessoas também, é que os escritores são mortais. Mas sempre tem aquele texto inédito que é achado no fundo de algum baú ou gaveta, assim, a obra de cada escritor não é tão limitada quanto a morte pareça limitar. Assim, minha atual "mudez" (nesse novo blog que quase nunca posto) é a minha contribuição para esses insaciáveis leitores. Aliás, já que "eles" são insaciáveis, não há contribuição, é indiferente que eu escreva ou deixe de escrever.
Que não se pense que isso é uma tentativa de explicação para minhas palavras escassas, é mero "insight" que aproveitei para transformar em post preenchendo assim a lacuna do meu calendário blogal.
quinta-feira, 18 de setembro de 2008
segunda-feira, 4 de agosto de 2008
terça-feira, 1 de julho de 2008
Ambíguo Ernesto
Ele tinha dois nomes, duas casas, duas namoradas: uma morava na mesma cidade que ele, a outra vivia longe e eles se viam pouco, comunicavam-se mais por cartas. Ele teve duas mães: uma que o pariu e outra que o criou. Tinha dois carros: um para ir trabalhar e outro para os finais de semana: tudo em sua vida era duplo, inclusive seu queixo. Talvez não fosse à toa que tivesse duas narinas. Na prova que fez para conseguir o emprego, passou em segundo lugar: eram duas vagas. Morava num apartamento de dois quartos no segundo andar do Bloco II do prédio D. Pedro II. Teve cálculo renal nos dois rins. Geralmente no almoço devorava uma dupla caipira: angu e torresmo. Morreu duas vezes: teve parada respiratória e o médico o ressuscitou, mas em vão: ele não resistiu. Pensaram em comprar dois caixões para o seu funeral, mas desistiram: ele tinha duas contas em dois bancos distintos, mas deixara dois filhos para serem sustentados.
segunda-feira, 30 de junho de 2008
Dama de copas
E ela era tão insegura que não conseguia sustentar suas inúmeras estrelas, e o medo surgia ramificado de suas entranhas de onde brotavam fezes ocas, e ela se escondia por trás da imagem bidimensional da dama de copas do baralho velho e sujo.
terça-feira, 24 de junho de 2008
Premilho
se eu viro fóssil
tão fácil
quanto você faz ostra
fixo o fato no falo
e falo com minha falange
finjo que me firo numa fuga constante
e fico fatal feliz
fugaz fatiga
Roda gigante
Velha cantiga
De milho a canjica
no papo após
o aperto.
tão fácil
quanto você faz ostra
fixo o fato no falo
e falo com minha falange
finjo que me firo numa fuga constante
e fico fatal feliz
fugaz fatiga
Roda gigante
Velha cantiga
De milho a canjica
no papo após
o aperto.
segunda-feira, 16 de junho de 2008
Inverossímil míssil
O cio no ócio é fóssil
o seu ódio faz lançar míssil
a hóstia se desfaz na língua
enquanto o padre celebra a missa
que eu não vou mais aos domingos.
De fé não tenho mais nem um pingo
ou tanto quanto um flamingo:
o ritual agora
é inverossímil
e inassimilável.
o seu ódio faz lançar míssil
a hóstia se desfaz na língua
enquanto o padre celebra a missa
que eu não vou mais aos domingos.
De fé não tenho mais nem um pingo
ou tanto quanto um flamingo:
o ritual agora
é inverossímil
e inassimilável.
terça-feira, 10 de junho de 2008
da igreja barroca o reboco
do índio brasileiro o botoque
da cabeça da velha o coque
do ingresso do filme o troco
do palácio real o trono
da almofada macia o botão
do lanche da tarde o pão
da cama à noite o sono
da cabana do índio sem dono
do jantar da noite insosso
da coxa de frango o osso
do salário nosso o abono
da esfera fria e lisa
escorre o escuro dos metais.
o cabelo da menina eu corto
com punhais.
do índio brasileiro o botoque
da cabeça da velha o coque
do ingresso do filme o troco
do palácio real o trono
da almofada macia o botão
do lanche da tarde o pão
da cama à noite o sono
da cabana do índio sem dono
do jantar da noite insosso
da coxa de frango o osso
do salário nosso o abono
da esfera fria e lisa
escorre o escuro dos metais.
o cabelo da menina eu corto
com punhais.
por baixo de sua pele de onça
via-se sua mente insana
cabelos desgrenhados
dentes encavalados:
nascida de parto prematuro
nem olhou pra trás
depois que pulou o muro.
Correu vinte léguas para encontrar a praia:
nadou, boiou e tirou a saia:
respiração ofegante
e de repente uma onda
que ela não soube enfrentar.
Girou na espuma, ralou no fundo
bebeu água e morreu no mar.
via-se sua mente insana
cabelos desgrenhados
dentes encavalados:
nascida de parto prematuro
nem olhou pra trás
depois que pulou o muro.
Correu vinte léguas para encontrar a praia:
nadou, boiou e tirou a saia:
respiração ofegante
e de repente uma onda
que ela não soube enfrentar.
Girou na espuma, ralou no fundo
bebeu água e morreu no mar.
segunda-feira, 9 de junho de 2008
Aos 4 ventos
estou com uma doença crônica
que me deixa muito auto-crítica:
censuro minha orquestra sinfônica,
bloqueio meu forró sanfônico.
tal estado é tétrico:
uma ditadura mórbida
preciso de coragem rápido
movida a energia eólica.
que me deixa muito auto-crítica:
censuro minha orquestra sinfônica,
bloqueio meu forró sanfônico.
tal estado é tétrico:
uma ditadura mórbida
preciso de coragem rápido
movida a energia eólica.
quinta-feira, 5 de junho de 2008
quarta-feira, 4 de junho de 2008
segunda-feira, 2 de junho de 2008
na seqüência lusófona...
Tive um poema de amor
Na mão aberta
Quis com ele construir
Uma mesa
Uma jarra
Um assobio de perturbar
Fantasmas.
Abriram-me os dedos:
Caiu no chão um montão de palavras
Inabitáveis.
(Egito Gonçalves)
Na mão aberta
Quis com ele construir
Uma mesa
Uma jarra
Um assobio de perturbar
Fantasmas.
Abriram-me os dedos:
Caiu no chão um montão de palavras
Inabitáveis.
(Egito Gonçalves)
Anjo
(Teresa Balté)
Não o pombo futurista mas a sombra
no ângulo vazio a folha de hera
e as orquídeas brancas na garganta
a vertigem do grito o labirinto a lâmina
as aves que evoluem não regressam
devoraram o espaço onde existiam
assinalam agora outras galáxias
cicatrizes rosáceas
a asa é o recanto da memória
o vértice onde o corpo não pesou
agora só gorjeio a harpa morna
musgo nos olhos o anjo de granito
Não o pombo futurista mas a sombra
no ângulo vazio a folha de hera
e as orquídeas brancas na garganta
a vertigem do grito o labirinto a lâmina
as aves que evoluem não regressam
devoraram o espaço onde existiam
assinalam agora outras galáxias
cicatrizes rosáceas
a asa é o recanto da memória
o vértice onde o corpo não pesou
agora só gorjeio a harpa morna
musgo nos olhos o anjo de granito
"Dai-nos, meu Deus, um pequeno absurdo quotidiano que seja,
que o absurdo, mesmo em curtas doses,
defende da melancolia e nós somos tão propensos a ela!"
Alexandre O’Neill, poeta português
que o absurdo, mesmo em curtas doses,
defende da melancolia e nós somos tão propensos a ela!"
Alexandre O’Neill, poeta português
sexta-feira, 30 de maio de 2008
aragem
No cálculo exato ele era preciso
Num porre, perdeu o incisivo
E nada ficou decidido
daquela debandada rápida:
no rapto da grávida
ele teve fome ávida
de banana batida com leite
servida no chifre de rinoceronte.
catástrofe no horizonte
no vértice era o fim.
Cada aresta pontiaguda
se esmera em chafurdar os balões.
Para quê?
para quê?
Num porre, perdeu o incisivo
E nada ficou decidido
daquela debandada rápida:
no rapto da grávida
ele teve fome ávida
de banana batida com leite
servida no chifre de rinoceronte.
catástrofe no horizonte
no vértice era o fim.
Cada aresta pontiaguda
se esmera em chafurdar os balões.
Para quê?
para quê?
Mancha quebrada
A borra de café era inócua à sua inteligência pálida: não a amparava, corria paralelamente a uma camada fina de gelo cristal.
segunda-feira, 26 de maio de 2008
terça-feira, 20 de maio de 2008
F(r)icção
O que foi feito daquela garota que ontem na cafeteria passava patê com a espátula como se esta fosse um cinzel e a torrada uma escultura? Ao seu lado, sobre a mesa, o romance Frango xadrez, de Varvara Angel. Teria ela já lido a parte em que Roscardo se suicida? Como teria reagido à leitura deste episódio? A cabeça inclinada para a frente, concentrada no minucioso trabalho com o patê e as torradas, e um cacho pendendo de lado, anelando-se em espiral. Era possível ver, sob a blusa branca, um sutiã rosa claro, não tão claro, cor de batom. No chão, encostada na cadeira, uma bolsa flácida. Mas meu celular tocou e enquanto eu me concentrava na conversa, ela saiu sem que eu me apercebesse. Ela esqueceu um maço de cigarros que escorreu de dentro da bolsa que fora pousada delicadamente (eu vi, quando ela chegou) no chão. Eu nem sei seu nome, e nem fumo, mas enquanto a homenageava, à noite, em meu quarto, acendi um dos cigarros do maço esquecido.
rã coaxante
Acordou com um Às na manga: os períodos longos dos textos alheios sempre deixavam-na perdida. Naquele despertar cochilante de quem tenta escapar das brumas dos sonhos, lutava contra o sono que embaciava-lhe os olhos: onde a fonte que jorra palavras que se abre como uma janela no limiar do sono - vigília? Então havia labor com inspiração: transpiração / inspiração. Uma massa de letras orgânicas, letras expelidas como ácido úrico. Então era tudo uma questão de responsabilidade? "O galo tece a manhã". Manhã suave de bebê acordando... Busca infrutífera: melhor voltar pra cama e dormir o sono dos deuses, e permanecer na cama até que não haja mais sono, como uma paralítica que não pudesse jamais se levantar e tivesse que suportar pacientemente a horizontalidade de sua condição.
segunda-feira, 19 de maio de 2008
título do blog
Pensei em "Mel com orégano". Mas permaneceria no campo gastronômico. Pensei numa infinidade de ótimos títulos, aqueles que cairiam como uma luva, que vieram à tona como chuva fina, mas não anotei nenhum e esqueci todos. Então escolhi "Troca de pele" para simbolizar essa minha nova fase. Mas o que troquei e o que é novo, isso vai ficar subentendido por quem me acompanha desde o "Queijo com chocolate". Seja bem-vindo ao meu mais novo espaço virtual!
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