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quinta-feira, 14 de julho de 2011

eu queria dizer
que há sopa no cabelo
e que a corcova do camelo
foi remendada com durepox

o resto eu digo depois
quando as nuvens tingirem o céu
de brancos veludos e gastas gazes
e depois de passada essa fase

ameaço um soluço e tusso um isopor
e sopro um arroto incolor

como se injeta banha no osso
se é ingorduroso o almoço
e se os farelos do jantar nosso
não se desmigalharam da mesa?

a manhã tece um céu sedutor
e da chuva brota um bolor
que satura os líquidos depois
de amanhã não quero saber
da Terra
pois não quero saber
da guerra
pois o que mais ocorre
nessa irregular
esfera?

a maçã, a uva e a pera
foram visitar a salada
e morreram engolidas
para não morrerem queimadas
nas labaredas crepitantes
da fogueira de São João

E então?

o que ocorre e o que não?
quando você vai alugar o salão
para as festas profanas?
a professora Ana
e a tia Edilamar
me ensinaram
que rimar é pecado
pois unir os dois lados
das mesmas palavras
pode gerar
perigosas lavras

por isso eu tenho cuidado
pra não rimar demais
por que se rimo eu arrumo
muito problema
e a pobre ema
fica sem almoço
roendo os caroços
das frutas insossas
e as nuvens fogem dos céus
e chove um granizo raro
que embolora a grama
e amarela a couve
mas depois eu ouço
com muito cuidado
pros sons não escaparem
pelas frestas das portas
uma música satânica
pra purificar meus pecados
e tornar leve
os ares pesados
das grossas rotinas
e das aéreas cortinas
que vazam endorfinas pelos poros
e tenho muito cuidado
pra não rimar demais
porque se eu rimo, depois
é perigoso demais

eu sei que é proibido
escrever poemas
por isso eu rimo escondido
e varro as letras
pra debaixo do tapete
pra ninguém ver essa sujeira espessa
que borra o papel
e entorta as linhas
que enevoa o céu
e faz faltar a farinha
do pirão
porque é proibido
escrever poemas
então eu escrevo escondido
como se o crime
fosse perfeito

mas cada palavra
me enjaula
pois o crime é o próprio castigo
e o cárcere é o meu abrigo
inóspito
como um hospital caído
depois de rolar da ribanceira

depois da segunda
vem a terça-feira
e cada dia
é uma grade
da jaula
da semana inteira.

2 comentários:

Anônimo disse...

Pra lá de inspirada agora heim! Gostei...

beijo, Luizinho

Luis Eustáquio Soares disse...

belo poema, coralina coral, no qual o tempero é mistura de gozo e dor, através da pimenta viva do cotidiano, a partir do qual tudo é antropofagicamente agregado no impossível, a vida.
b
l