Li no blogue Mingau de aço (que aliás é um blogue que gosto muito), seu autor falando sobre "nojinho de pobre", e criticando quem milita na web mas fecha o vidro do carro depressa quando vê um pedinte.
A hipocrisia é mesmo repudiável, mas é muito mais cômodo dar 50 centavos, 2 reais, 5 reais que seja a um mendigo do que verdadeiramente lutar pela igualdade. Esmola não resolve o problema de ninguém, nem de quem a recebe (ou melhor, só resolve a consciência de quem a está dando). Serve, no máximo (além do que fica dito no parêntese anterior), para matar a fome por algumas horas, mas não resolve a situação social do pedinte e muito menos a do restante da sociedade!
De toda forma, penso que o blogueiro do Mingau de aço está cansado de saber que esmola só "abafa o caso" e quem a pratica pelo polo ativo ainda fica se achando um benfeitor da humanidade, e chega a encostar na mão do mendigo ao entregar as moedas só para dizer (enganando a si mesmo) que não tem nojo de pobre.
Verdadeira revolução faz é um Marcos Bagno da vida, ao escrever A língua de Eulália, por exemplo, ousando falar contra a discriminação dos falantes de português não-padrão. Bagno toca, com elegância, num problema que está enraizado no cotidiano de todos os brasileiros. Quem nunca debochou de alguém que fala "probrema", por exemplo? Bagno nos mostra que trocar o L pelo R é uma tendência natural na língua portuguesa. "Escravo" veio do latim "sclavu", por exemplo, e ninguém ri de quem fala ou escreve "escravo", porque nessa e em outras palavras - como "praia", que veio de "plaga" - a transformação se oficializou. Bagno também mostra que Camões, tido como o pai da língua portuguesa, escreveu "frauta", "frechas", "Ingrês" e "pranta".
Através desse fenômeno (chamado "rotacismo") e de outros, Bagno nos mostra que o português não-padrão tem "uma clara lógica linguística" e "regras que são coerentemente obedecidas", e que seus falantes não são mentalmente inferiores, como pensam muitos, e que essa variedade do português, o português não-padrão (ou PNP, como o chama Bagno) não é errada, nem pobre de recursos: ao contrário, é eficiente.
O português padrão (PP) deve ser ensinado, sim, mas para que ele seja acessível a todos, não podemos continuar causando complexo de inferioridade em quem fala o PNP, atitude que com certeza é uma grande responsável pela evasão escolar.
Marcos Bagno, em A língua de Eulália, utiliza de linguagem extremamente acessível, disponibilizando para qualquer um, mesmo para quem nunca estudou Linguística, conhecimentos que conscientizam, alargando a mente dos leitores ao libertá-los de seus preconceitos.
3 comentários:
Passei por aqui, bjs
belo texto, de visceral universo, helena.
tem o seu jeito, leve, suave, aberto a variáveis múltiplas, livre.
beijos
luis
Esse preconceito linguístico que certamente não deva ser exclusividade do povo tupiniquim, mas que aqui onde há uma desigualdade entre as classes incomparável, só vem a confirmar essa consciencia ilusória que prende um grupo elitista de viver no nível da "moral". Se Kierkegaard fala superação do estágio da moral per o da religião, Bagno entra com a superação pela lingua livre, língua comunicativa.
Belo texto, Helena. Bagno ´daria uma reflexão e tanta
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